25 abril 2011

O talento e voz de Ellen Oléria

Fonte: baoobaa.com

Ela é de Brasília e corre o país levando a boa música brasileira, traçada pela sua voz reverente que acompanha seu violão. Ela é Ellen Oléria, cantora, compositora e instrumentista.

Ellen tem um jeito original de fazer música: além de escrever o que sente, mergulha no samba, funk, soul, bossa nova, rap e cria canções como “Testanto”, “Posso perguntar?” e “Senzala – Feira da Ceilândia”.

Conheça, agora, essa cantora que diz exclusivamente para o Baoobaa sobre sua trajetória!

Quando você começou a cantar?
Com certeza, antes de aprender a falar. Pelo menos é o que a Dona Eva diz…

Quando surgiu, em você, o amor pela música?
Desde muito pequenininha, quando via meu pai tocar a sanfona dele ou quando ouvia modas de viola bem tristes e, ainda pequenina, chorava.

Quais são suas influências musicais?
Cada fase da vida traz um balaio bem fundo de influências pra mim. E o que chega no ouvido e alimenta a alma vira material pra criação também. Ou só chega pra me fazer sentir viva mesmo…

Atualmente, escuto muito as mixtapes do DJ Nyack, Max de Castro, Emicida, GOG (que tenho o privilégio de acompanhar na produção do novo disco), me apaixonei pelo disco Mel da Maria Bethânia, The Cinematic Orchestra (principalmente o disco Mafleur – todo lindo!), Tim Maia (sempre indo e vindo em meus momentos), Elis e Tom (esse disco duo é demais!), Gilberto Gil (gosto muito do Unplugged), Jovelina Pérola Negra (fiz uma seleção dela e coloquei no ouvido… É pra não tirar!), Wilson Simonal. E o último som que não para de se repetir aqui em casa é um disco de Chico da Silva, grande sambista natural de Parintins, AM. Adoro!

Qual é a importância da música negra para você?
Vejo na música uma das mais potentes formas de resistência e sobrevivência difundidas na diáspora africana. Produzimos muito e em muitas áreas de conhecimento, mas a música foi, desde o início do processo de escravização nas Américas e Caribe, um elo entre diversos povos e nações sequestrados, presentes aqui na confusão da “nova Babilônia”.

O poder da música negra tirou o samba do fundo do quintal apenas, e fez ganhar o mundo junto com o chorinho e, num momento mais contemporâneo, o afro pop brasileiro (axé).

O povo negro se apoderando dos instrumentos europeus fez os brancos cantarem e dançarem ao som do funk, do jazz, do hip hop e do gospel. Ou chorar com o blues e todo mundo caiu na sedução do R&B.

Maracatu, congados, marabaixo, maculelê, afoxés, ijexás, a música permitiu que contássemos as nossas histórias que não couberam nos livros eurocêntricos do Brasil.
Foi também importante, e continua sendo, no sentido de diluir as fronteiras étnicas pra um maior entendimento da nossa presença no planeta enquanto seres humanos, antes monstrificados pelo olhar do homem branco cristão.

É só olhar a história da arte que a gente vai ver nomes de gente negra entre cantores/as, compositoras/es e instrumentistas (que não caberiam numa lista só) quebrando tabus e escandalizando quem se identificava como dominador, mas que faz um coro só se unindo às nossas vozes e nosso swing! É o poder da música negra.

As letras das suas canções falam sobre a sociedade, sobre questões étnicas. Qual é a mensagem que você quer passar a partir do seu trabalho?
Não acredito que a música que eu faço traz uma mensagem “x”. Cada música tem sua própria carga e caminha sem meu controle. Eu só faço o mapa com minha sugestão de ponto final. Mas a andança quem delimita é quem se lança no caminho.

Acho que, mais do que passar mensagem, estou fazendo minhas colagens. Juntando os ingredientes da minha farofa! Mas se houver alguma mensagem, acho que ela pode ser: “esse é o registro da minha passagem”.

O mais legal disso é que, quando você canta comigo, chora comigo, beija comigo, transpira comigo, ao som dessa canção aí que só me atravessou primeiro, esse se torna, então, o registro da nossa passagem.


Na sua caminhada, você já se deparou com algum tipo de preconceito?
De várias ordens.

Em “Senzala – Feira da Ceilândia” o que é a “Feira da Ceilândia”? Por que lá se pode comprar de tudo menos “razão, consciência, senso, inteligência, uma cabeça pra pensar”?
Ceilândia é uma cidade-satélite do Distrito Federal (no DF, não temos cidades nem municípios, mas sim regiões administrativas às quais chamamos cidades-satélite), nascida da sigla CEI – Campanha de Erradicação de Invasões; ou seja, as pessoas que construíram seus barracos muito perto do Plano Piloto, logo nos primeiros anos após a inauguração da nova capital do Brasil, foram relocadas para 27km de distância da zona central de Brasília. Sem infraestrutura nenhuma.

O povo sobrevivente de mais uma realidade dura construiu uma região administrativa de mais de 200 mil habitantes, com uma zona comercial pulsante e intensa. No Centro de Ceilândia, temos a Feira Central, lugar que inspirou a letra, muito mais como uma homenagem, mesmo, cresci por aquelas quebradas também. Sou uma cliente da Feira Central da Ceilândia.

A letra fala de moda. E a moda se caracteriza por fluxos. A brincadeira é exatamente essa: como se encaixar num fluxo ditatorial da moda? Principalmente porque, até a moda chegar às mãos de quem não tem dinheiro para comprá-la, o fluxo da moda já mudou.

Falei, na letra, do que não se compra lá na feira: razão, consciência, senso, inteligência e uma cabeça pra pensar. E brinquei falando que isso se compra no shopping. Muito mais porque é de lá que vem a moda que chega até a feira.

Razão, consciência, senso, inteligência e uma cabeça pra pensar… Isso não se compra. Nem no shopping, nem na feira.

Você teve uma formação musical que também inclui a música sertaneja. Quais foram os cantores, bandas que te influenciaram no cenário sertanejo?
Tião Carreiro e Pardinho, Pena Branca e Xavantinho, Almir Sater, Roberta Miranda (compositora do grande sucesso “A majestade, o sabiá”), Irmãs Galvão, Milionário e José Rico, Roberto Correa, meu grande mestre: Seu Badia Medeiros… Tem muita gente nessa beira. Gosto muito das letras da Paula Fernandes.
Eu adoro causo, personagens, paixões, perdas, triunfos. A música sertaneja tem muito disso. Uma poesia que continua amando tanto esse planeta.

Conte um pouco sobre seu título de maior vencedora da história no Festival de Música Tom Jobim no SESC, no DF.
O Festival é uma mostra competitiva. Com premiação em dinheiro. Um jeito bacana de encontrar as/os amigas/os que fazem música também por aí, conhecer seus trabalhos, fazer parcerias. Encontrar um público apresentando nosso trabalho e também tentar reverter as premiações em ações em prol da continuidade da produção cultural local. Esse é, afinal, nosso ofício.

O que é necessário para transformar a sociedade?
Amor. Muitas vezes a ira. Mas eu acho que tudo se resume em desejo. O que você quer?




Encontre + de Ellen Oléria em
www.myspace.com/ellenoleria

Fonte: baoobaa.com